A Intervenção Federal no Rio de Janeiro acaba neste final de 2018.
Qual foi seu resultado?
Antonio Celso Ribeiro Brasiliano, CIGR, CRMA, CES, DEA, DSE, MBS
Publisher da Revista Gestão de Risco e Presidente da Brasiliano INTERISK.
A Intervenção Federal, com Tropas das Forças Armadas, principalmente do Exército Brasileiro irá acabar, neste 31 de dezembro de 2018, no Rio de Janeiro, infelizmente com resultados considerados pífios. Faltou, por parte do governo federal, dar a tropa a segurança jurídica para que houvesse ações efetivas e contínuas, visando desbaratar e desmantelar as estruturas existentes das facções criminosas, incluindo as milícias.
Desde o início da intervenção federal no Rio de Janeiro, em fevereiro de 2018, foram realizadas 584 operações de segurança monitoradas, envolvendo 195 mil agentes. Muitos índices de violência, segundo o Instituto de Segurança Pública, de janeiro a novembro de 2018, publicado na Revista Istoé de 19 de dezembro de 2018, aumentaram, em comparação com o ano anterior. Houve também melhorias, como a queda de latrocínios:
Claro que são números gelados, mas um ponto é certo, o Rio continua com seu clima de insegurança instaurado, pois as facções criminosas não tiveram seu poder bélico diminuído, nem se sentiram ameaçadas, pelo contrário, faziam questão de afrontar o Estado desfilando com seus fuzis e outros tipos de armamentos pesados.
Faltou ao Estado Federal fornecer ao Interventor poderes para que este pudesse agir com maior eficácia e agressividade que o momento exigia.
Escrevi na Revista 118 de fevereiro deste ano, que para a intervenção ter o sucesso necessário, a eficácia desejada, haveria necessidade de uma mudança radical da postura do governo federal. Em fevereiro de 2018 escrevi, tenho que repetir para fazermos um paralelo:
“O governo federal, na figura do presidente da república, dá com uma mão e tira com a outra, pois onde já se viu uma tropa de intervenção sem poder de polícia? Sem a segurança jurídica necessária para o engajamento com os criminosos? Há alguns dias, logo no início da intervenção, na Globo News, o General Quatro Estrelas, Augusto Heleno, Primeiro Comandante das Tropas Brasileiras do Haiti e meu instrutor como Capitão na AMAN, discorreu corretamente que faltava a segurança jurídica e protocolos de engajamento (situações onde a tropa, sob a ordem do comandante da ação poderá atirar, inclusive com a intenção de matar) para dar a segurança necessária aos militares, o que está corretíssimo. Porque? Não tem cabimento, é simplesmente ridículo para o Brasil o desfile, este é o nome mais apropriado e debochado, devasso, depravado e zombeteiro que encontro para descrever os traficantes e criminosos com fuzis, pistolas, granadas, lança foguetes, a tiracolo mostrando para todos verem seu “poderio” de fogo. Ridículo a posição do cidadão, se sente ofendido em suas entranhas.
O sucesso da Intervenção, e torço muito para que os resultados surjam, dependem, no meu ponto de vista, dos seguintes fatores de riscos motrizes:
1) Flexibilidade para a tropa: regras de engajamento, com ordem de atirar para matar quem estiver portanto arma de fogo com atitude hostil e de calibres de guerra. A atitude é extrema, é, mas a situação de hoje também é. Portanto em situações de extremo risco, respostas de extrema contingência; NÃO ACONTECEU, PORTANTO TIVEMOS INEFICÁCIA;
2) Mobilidade para a tropa: necessita de deslocamentos rápidos e agressivos, descidas de surpresas em áreas onde a subida a pé ou de veículos é muito demorada e serão notadas; NÃO ACONTECEU, TODAS AS OPERAÇÕES FORAM REALIZADAS COM VEÍCULOS PESADOS, POUCO USO DE AERONAVES;
3) Tropas especializadas: com treinamentos especiais e direcionados, tais como forças especiais, comandos, comandos anfíbios, paraquedistas, e um ponto crucial, os integrantes não podem ser da cidade do Rio de Janeiro. Estas tropas fariam as ações pontuais de combate e destruição; NÃO OBSERVEI NAS 584 OPERAÇÕES A UTILIZAÇÃO DE COMANDOS E FORÇAS ESPECIAIS, ESPECIALISTAS EM COMBATES DESTA NATUREZA;
4) Inteligência: serviço essencial para levantamento de dados e informações, com sistemas de análise de riscos, garimpagem de dados, cruzamento de ligações e de pessoas, identificação de pessoas, montagem das famosas aranhas para entender a malha de cada facção e estrangular o fluxo financeiro. Sem dinheiro as facções não giram, não conseguem pagar seus fornecedores e caem pela manobra, monitoramento com drone de pontos quentes. Ou seja, uma série de ações que a Inteligência Carioca já deve possuir, basta unir, integrar e analisar. Sem a inteligência não há a eficácia da ação; EM ENTREVISTA O GENERAL BRAGA AFIRMOU QUE INTEGROU AS INTELIGÊNCIAS, DAS DIVERSAS ÁREAS, NÃO OBSERVEI AVANÇOS NESTA ÁREA E O DESMANTELAMENTO DAS FACÇÕES COM PRISÕES DOS SEUS PRINCIPAIS LÍDERES, INCLUINDO OS MILICIANOS;
5) Combate Direto aos Corruptos das Instituições Policiais – “Banda Podre”: todos sabem quem são, onde estão e o que fazem. Há o silêncio tácito, pois ninguém possui a percepção de segurança necessária de delatar o esquema. Tem-se que, usando as palavras de Bill Bratton, o Chefe de Polícia de Nova York, de 1994 a 1996, que reduziu a criminalidade com índices quase iguais ao da cidade do Rio de Janeiro, sem aumentar seu orçamento, disse em relação a corrupção nas instituições policiais: Alavanque os anjos e silencie os demônios, ou seja, retire de circulação a banda podre e prestigie os honestos. A diferença será no curto prazo; SE HOUVE NÃO TEVE DIVULGAÇÃO, APENAS TROCAS DE FUNÇÕES, SEM MUITA EFETIVIDADE; OS RESULTADOS FALAM POR SI;
6) Projetos Sociais com Universidades, Empresariado Carioca e Fluminense, Sociedade Civil Organizada: Segurança Pública não pode ser agenda de partido político, esquerda e direita. É um direito do cidadão. Há necessidade de realizar ações e programas estruturantes relevantes de resgate a cidadania nas áreas que eram dominadas pelo crime. Tem que haver um entendimento forte entre os setores públicos, privados, universidades e a sociedade civil organizada. Ponto importante é fazer com que as empresas que saíram do Rio retornem. Por exemplo na cidade Colombiana de Medellín, no pior momento, em 1991, a taxa era de 380 homicídios por 100.000 habitantes, quase três vezes a média da cidade mais violenta do mundo hoje, a salvadorenha, San Salvador. Desde então, os homicídios em Medellín caíram 90%, resultado de Política Nacional de Combate ao Narcotráfico e de iniciativas locais para investimentos na cidade. Programas de Educação/Capacitação, Saneamento, Limpeza, Saúde, Esporte, Trabalho e Cidadania são cruciais e estratégicos para que as tropas tenham boa receptividade e passem a interagir com as comunidades. Sem isso veremos, infelizmente o que ocorreu com as UPP’s. Faliram por falta de continuidade em função da corrupção do Estado Carioca. ZERO EM PROJETOS SOCIAIS COM AS COMUNIDADES INTEGRADAS COM UNIVERSIDADES, COM O OBJETIVO DE INTERAÇÃO E A BUSCA DE INFORMAÇÕES;
Como um último tópico eu investiria também fortemente, com o objetivo de:
7) Prevenir Efeitos Colaterais: Treinamento nos protocolos de engajamento, evitando ações descontroladas e desmedidas; Treinamento e Programa para a Tropa de aproximação com a População das Comunidades – Ação Cívico Social – EndoMarketing, visando quebrar o gelo e interagir; Treinamento de Estado de Direito para a População das Comunidades.
Estas sete ações estratégicas, são consideradas estratégicas para bloquear as causas motrizes Esta ação pode ter acontecido, com a tropa, visando haver melhor comunicação e interatividade.
Então de sete ações que considero estratégicas, apenas uma foi posta em prática. Os mesmos cenários construídos por mim em 2007, quando da minha tese de doutorado, ainda se mantém atualizado, infelizmente. Como disse do ponto de vista desta edição, Albert Einstein já discursa que: “Insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes.”
O Rio de Janeiro está batendo na mesma tecla há mais de 38 anos, e o resultado é o que estamos vendo, a situação é uma gangorra do sobe e desce dos índices de criminalidade e violência, que quando voltam, tornam-se cada vez mais fortes e estruturados. Tornam-se antifrágeis, como escreve Nassin Taleb, e pior que ninguém enxerga isso.
As ONG’s, os governos e as forças de segurança, continuam com o mesmo modelo mental, não se reinventaram, não se inovaram frente aos novos desafios que temos que enfrentar neste mundo Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo. Não fizeram como fez o General Stanley McChrystal, Comandante das Tropas Aliadas no Afeganistão, visando criar disrupção no Modelo de Ação das suas Operações: “criamos um time de times, conectado através de uma consciência compartilhada e execução empoderada. Quase tudo que nós fizemos corria contra qualquer grão de tradição militar e práticas de organização. Nós abandonamos muitos dos preceitos que ajudaram a estabelecer nossa eficácia no século XX porque o século XXI é um jogo com regras completamente diferentes para nós. Para combater uma tropa indisciplinada como os Talibans – Al Qaeda, sem hierarquia e organização tradicional, não podíamos trabalhar de forma contrária. Tivemos que inovar. Mudar o modelo mental. Pequenos grupos e compartilhar as informações, e o comando era por competência da missão.”
Será que não está na hora de pensarmos fora da caixa? Mudar o modelo mental? Inovar na forma de enfrentar a criminalidade que assola o Rio de Janeiro? Utilizar ferramentas e análises de riscos? Cenários? Quem sabe não começamos a ter resultados?